D
Que o amor de uma mulher
Ela te mostra que todos os caminhos
Levam onde você quiser.
Mesmo que só queira
Mais uma vez e para a vida inteira
Apenas o amor dessa mulher.
Eu vinha do Norte.
O lado poético da vida (ou o lado vivo da poesia)
Faxina
Dois ônibus e um metro ela pegou. Ela vem de longe. Só para me ver.
Só nos vemos às terças feiras. Ela chega sempre cedinho, lá pelas nove. Eu passo a semana inteira ansioso como um adolescente inexperiente, esperando-a. Nunca fui adolescente, mas sei como eles são.
Quando ela chega, ele já foi, graças a Deus. Tenho até o meio dia, quando ele volta, para ficar sozinho com ela.
Sinto a maçaneta da porta de entrada girar e meu coração dispara. Fico alerta. Sigo seus passos no taco frio do corredor, trazendo o barulho de seus tamancos até mim. Estou totalmente concentrado quando ela abre minha porta.
Minhas paredes dilatadas pela tensão da espera, se relaxam. Ela olha dentro de mim, não gosta do que vê, mas volta toda semana. Se isso não é amor, eu não sei o que é. Acho que a empregada do Gustavo me ama.
Eu percebo isso em seus movimentos, pegando camisetas abandonadas no chão, tão saudosas de meus cabides. Algumas estavam ali há apenas um dia. Uma camiseta vermelha da Nike é veterana de ficar no chão há mais de uma semana.
Ela pega todas. Dobra-as má e porcamente. Não se dá ao trabalho de coloca-las nas gavetas. Concordo. Ele que bagunça, ele que arrume. Ela está aqui por mim.
E eu sei por quê. Há muita cultura em mim, espalhada em livros esparramados pelo chão, pilhas de cd´s, quase todos guardadas nas caixinhas erradas, amontoadas em estantes. Ele compra muito dessas coisas e deixa aqui comigo, para que eu tome conta. E como ele não tem tempo para ler todos os livros ou ouvir todos os CDs que compra, eu faço isso por ele. Sou muito mais culto que ele.
Meus armários estão abertos. Várias camisas amassadas guardadas nos cabides. Elas não deviam estar ali, e ela as pega. Voltam sempre lisinhas, quentes, ah que inveja.
Enquanto a vejo cuidar de mim, ela canta, tirando o pó debaixo da cama com uma vassoura. Em segundos ela irá embora. Abre minhas janelas, para que eu respire melhor e...
Pronto. Foi-se embora.
Quando ele chega, estou novinho em folha. Em 5 minutos ele já me faz sentir saudades dela. Ah, Gustavo, tenha dó do seu pobre quarto.
O artista e sua arte
Travam uma constante luta,
Uma inesgotável busca
de um pelo outro.
(Num palco escuro,
limitado por cortinas vermelhas
um velho palhaço há muito esquecido.
Cantando sua coleção de saudades
E seus passados vividos.
-Mas artistas são todos os que vivem
o amor
ao menos uma tarde.
Amar, a nossa arte.
Sejamos mais artistas
meu amor!
Artistas da vida
lapidando sua rotina
Autores da vida
Ensaiando em cada esquina
- Que nossa arte, amor, seja amar.
Sem escolher por quais caminhos
Vivendo grandes amores pequenos
Amando juntos, amando sozinhos.
Nunca tentei ser nada por completo
Até hoje, sou cheio de lacunas.
Como espaços entre as colunas
Esse vazio que se acumula
É que me enche até a medula.
Se isso tudo for um filme
Eu saio antes do final.
Tento sem fazer força
E me esforço pra não tentar
O medo reflete em mim
A luz fria de um espelho rachado
Enquanto um violão toca lá fora:
Gritos de guerra e canções de amor
Não são assim, tão diferentes.
Nuvens de algodão
Folha de sulfite infinita.
No jardim de infância
Desenhava o céu
Com as cores da inocência.
Mas essa noite
Estrelas de neon
Pedem chuvas de suor.
Ela deita seu perfume em meu peito.
Ela tem o cheiro dos anjos.
Fosse um quadro
Seria o desenho da paz.
Mas é de carne
E não sabe o que faz.
Desesperado um dia
sussurrei declarações
No ouvido de um furacão.
Disse-lhe tudo que queria dizer-te.
Expliquei-lhe o que não pude explicar-te.
Confessei-lhe coisas que nem imaginas.
Dei-lhe uma missão e em seguida seu endereço.
Encarreguei justamente o vento destruidor
Para ser o mensageiro do meu apreço.
Pela cegueira que acomete os desesperados
Pus a natureza em um inútil impasse:
Nela, que só caminha para frente,
Depositei o meu desejo de que o passado regressasse.
E não é preciso previsão meteorológica para saber
O que sobrou das palavras que falei no ouvido do furacão.
Como um carteiro levou minhas palavras.
Como uma oração levou minha fé.
Como um traidor levou-me às lagrimas.
Só me traíste por que deixei que me traísse.
Manter o orgulho pode ser um mergulho irracional.
Traído por mim.
Subtraído de ti.
Na subtração de si
por si mesmo
não existem resultados positivos.
Onipotente e onisciente furacão.
Ouviste tudo que lhe disse.
Fizeste com minhas palavras um jogo
Cujas sujas regras fazem guerras.
Desmontastes os sentidos com seus ventos.
Quando do “Me perdoe" e do "Não me esqueça"
Invertestes tanto forma como os sentimentos
Declarando que“A culpa é sua não se esqueça”.
E do meu “eu te amo”,
Meu sincero e desesperado
Arrependido e apressado
tantas vezes represado “eu te amo”
Soprastes fora o amor.
E como o que sobra
não faz sombra
Mas nela mora,
Sobra “eu”solitário na escuridão.
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